Funk tipo exportação? O mercado está de olho no ritmo
Presidentes das principais gravadoras brasileiras comentam sobre a procura internacional pelo ritmo brasileiro e novos mecanismos para descobrir talentos
Presidentes das principais gravadoras brasileiras comentam sobre a procura internacional pelo ritmo brasileiro e novos mecanismos para descobrir talentos
Karina Balan Julio
6 de abril de 2018 - 13h45
No final da década de 1950, a Bossa Nova emergia nas vozes de figuras como João Gilberto, Tom Jobim e Vinícius de Moraes, e logo caiu no gosto da audiência internacional. Após 60 anos de transformações sociais e culturais, gravadoras apostam no funk como ritmo que carrega o embrião do sucesso global. Na Rio2C, presidentes da Universal, Sony e Warner Music comentaram a repercussão de artistas como Anitta e Kondzilla, e apontaram a internacionalização do ritmo brasileiro como uma tendência.
“A música brasileira sempre teve um estímulo em mercados internacionais: a Bossa Nova era um novo tipo de Jazz e a MPB seguia uma onda parecida. Mas a língua ainda é uma barreira atualmente. O estímulo para o reconhecimento internacional tem que vir de qualquer coisa que não seja a letra ou tema da música. No Funk, é o ritmo que gerou identificação mundial, assim como já havia acontecido com o raggaeton”, opina Paulo Junqueiro, presidente da Sony Music no Brasil.
Paulo Junqueiro, da Sony Music; Sergio Affonso, da Warner Music e Paulo Lima, da Universal Music (crédito: Marilu Dantas/divulgação)
Em um momento em que artistas de diversos portes conseguem ter maior projeção com as plataformas digitais, fica muito mais fácil atrair atenção do mercado internacional. “Tenho recebido muitos pedidos de artistas internacionais, de David Guetta a Bruno Mars, interessados no funk e pedindo listas de recomendação”, conta Sergio Affonso, presidente da Warner Music.
O executivo acredita que o funk tem potencial, inclusive, para superar o raggaeton como ritmo urbano internacional. “Independentemente do julgamento de cada um de nós sobre o funk, ele despertou interesse do mundo inteiro pelo Brasil. Aqui as pessoas ficam chocadas porque conhecem a letra, mas escutam músicas em inglês com letras parecidas sem saber”, comentou.
Reinvenção das gravadoras
Os executivos também discutiram o futuro da música e do processo de descobrir e promover artistas. Sergio Affonso explica que toda a metodologia de trabalho nas gravadoras mudou, e a forma de buscar novos talentos e promover música deixou de ser baseada só no feeling para englobar uma série de métricas e indicadores de um potencial sucesso. A figura do A&R (Artists and Repertoire), profissional tradicionalmente responsável pela pesquisa de talentos e desenvolvimento artístico dos artistas, também ganhou novos contornos.
“Há alguns anos recebíamos os DVDs, íamos a shows e recebíamos muita informação de mídia e parceiros para descobrir talentos. Hoje, existe uma responsabilidade analítica que é de ficar fuçando no YouTube e plataformas para achar artistas que chegaram aos seus 100 mil ou 1 milhão de streaming sozinhos”, conta Paulo Junqueiro.
Paulo Lima, presidente da Universal Music, afirmou que a empresa encara a descoberta de talentos como um desafio corporativo. “Não temos mais A&R, todos os funcionários da companhia são A&R e voltados para conteúdo. Não temos uma visão de que somos uma gravadora, pois nem ao menos temos estúdios”, diz. Ele enxerga cada artista que contrata como uma startup, uma marca.
“Vejo um artista como um sócio, e geralmente só interrompo uma parceria quando vejo que ele não vê valor na companhia. Todos os agentes têm de estar alinhados, o artista, o agente dele e a gravadora, senão dificilmente consegue-se criar um hit ou uma boa história”, avalia.
Sergio destacou que o poder de comunicação de um artista com o público é tão importante quanto saber cantar ou compor. “Essa comunicação junto ao público não pode falhar, e me interesso por artistas que conseguem fazer isso”, disse. Como exemplo, citou a cantora Anitta. “Já trabalhei com artistas bem sucedidos internacionalmente, mas nunca vivi algo como estou vivendo com ela: não há uma semana em que eu não receba pelo menos dois pedidos de artistas querendo fazer duetos ou trabalhar com ela”, conta.
O trabalho de gravadoras também foi impactado pela cultura do single, impulsionada pelo streaming, que fez com que as pessoas escutassem músicas de forma fragmentada em vez de se dedicar a um álbum inteiro. Isso permite às gravadoras e artistas fazer mais testes.
“Lançar um álbum com 10 música de uma só vez pode fazer com que o artista fique escravo daquele projeto durante dois anos ou mais. Já o single permite uma margem de erro: ele pode lançar uma música, aprimorá-la se quiser, depois lançar outra, e por aí vai. Isso dá uma liberdade maior, mas por outro lado gera mais custos”, finalizou Sergio.
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