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Mentes sombrias e seu apelo na indústria audiovisual

Aumento do interesse do público por questões psicológicas e comportamentais abrem oportunidades para roteiristas e diretores

Bárbara Sacchitiello
26 de abril de 2019 - 18h32

Personagem Edu (Bruno Gagliasso) era um assassino em série de mulheres em Dupla Identidade, de Gloria Perez (Crédito: Divulgação/Globo)

Edu é um rapaz bonito, educado e gentil com todos que estão a sua volta. É atencioso, romântico e preocupado em ser o melhor par possível para sua namorada. Quando ninguém está vendo, no entanto, Edu é um psicopata que seduz mulheres para assassiná-las em rituais repletos de crueldade.

A descrição acima é do personagem interpretado pelo ator Bruno Gagliasso, criado pelo imaginário de Gloria Perez para a série Dupla Identidade, exibida na Globo em 2014. Para compor o protagonista, a autora se inspirou no assassino estadunidense Ted Bundy, que na década de 1970 chocou o país ao revelar ser o autor da morte de 35 mulheres. Mas Gloria também se deixou levar pela criatividade pessoal e julgamentos próprios a respeito da obscuridade da mente humana.

“O psicopata é um personagem rico para a dramaturgia pela capacidade que ele tem de se multiplicar. No caso do personagem Edu, ele era, ao mesmo tempo, um príncipe e um predador. As duas personalidades existem naquele ser em posições totalmente compartimentadas. Tenho visto um aumento de séries e produções que abordam os distúrbios da mente humana e esse é um território muito rico para ser explorado do ponto de vista da ficção”, defende a autora.

Gloria participou do painel “O cérebro no centro da narrativa”, que reuniu roteiristas e diretores que já tiveram a experiência de abordar questões psíquicas em diferentes obras. Na opinião da autora, a tarefa de criar um enredo para uma mente psicótica é difícil por conta do distanciamento do autor. “É muito comum que, como escritores, a gente procure se colocar na pele dos personagens que criamos para compreende-los melhor e isso é muito difícil de fazer quando temos alguém que não possui vínculos, culpa ou remorso ou seja, que é totalmente fora das conveniências humanas que conhecemos”, aponta a autora da Globo.

Cineasta de O Lobo Atrás da Porta, que conta a trajetória que uma mulher que comete um crime brutal, Fernando Coimbra disse preferir não fazer julgamentos acerca dos distúrbios dos personagens para não afetar o arco da narrativa e a liberdade dos atores. No caso do longa-metragem, a assassina, interpretada por Leandra Leal, foi tratada com traços de psicopatia por sugestão da própria atriz, que pesquisou a vida da Fera da Penha, alcunha pela qual ficou conhecida a mulher na qual a história do filme se baseia. “A Leandra conversou comigo e disse que, ao analisar a trajetória, encontrou traços de psicopatia.

Os distúrbios psicológicos também foram abordados por Coimbra em um contexto diferente quando ele dirigiu e roteirizou dois episódios da série Terrores Urbanos, exibida pela Record. Nos episódios A Loira do Banheiro e O Homem do Saco, o diretor construiu uma narrativa dúbia: o terror sofrido pelos personagens eram maldições reais ou apenas fruto de mentes doentias? “Para fazer uma obra desse tipo precisamos construir uma trajetória para esses personagens que justificasse o fato de eles chegaram a um ponto de forte abalo mental. Fomos encaixando traumas e situações que deixasse mais verossímil a possibilidade de aquelas pessoas estarem em meio aquelas situações de terror”, analisa Coimbra.

Criador de diversos tipos nos roteiros que constrói, Braulio Mantovani faz uma analogia com o próprio cinema (um conjunto de imagens em sequência que dão a ilusão de movimento) para explicar que o cérebro é condicionado a enxergar coisas diferentes das reais. Por isso, o diretor ressalta a importância de, mesmo quando a proposta for reproduzir alguma história real, o autor buscar verossimilhança apenas em suas próprias convicções. “Ouvimos e lemos notícias tão absurdas a cada dia que, entre nós, roteiristas, é comum dizer que, se fizéssemos um roteiro sobre aquilo, ninguém queria acreditar. As histórias reais só funcionam bem na ficção se inventarmos elementos em cima delas. As pessoas precisam demais. Costumo sempre repetir uma frase que ouvi de Guel Arraes. “A vida é uma excelente roteirista. Pena que ela só entrega o primeiro tratamento do texto”, recordou Mantovani.

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