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Narrativas ancestrais

Alok, Célia Xakriabá e Mapu Huni Kui ressaltam a necessidade de ressignificar a história do Brasil

Fernando Murad
28 de abril de 2022 - 6h48

“Antes do Brasil da Coroa, existe o Brasil do Cocar. Antes do Brasil do verde e amarelo, existe o Brasil do jenipapo e do urucum. Não conheceremos o Brasil antes de conhecer a história indígena”. Assim a professora Célia Xakriabá, do povo Xakriabá, compartilhou no palco do Rio2C sua experiência como uma das roteiristas e na frente das câmeras do documentário Futuro Ancestral, produzido pela Maria Farinha Filmes em parceria com o artista, músico e empresário Alok – cujo trailer foi apresentado em primeira mão no evento.

Célia Xakriabá, Alok e Mapu Huni Kui: o futuro é ancestral (crédito: André Valentim)

A produção surgiu da ideia de Alok de gravar seu primeiro álbum original resgatando raízes indígenas. O projeto envolveu a participação de 12 povos indígenas em 30 dias de gravações nas serras de Minas Gerais. Além das composições criadas em parceria, a iniciativa gravou mais de 130 músicas tradicionais das diversas etnias que se transformarão em NFTs – sem escrita, os indígenas preservam a cultural de forma oral e vários cantos acabam se perdendo com a morte de anciãos.

“Esse é o projeto mais importante da minha vida, mas não é meu, é de todos. Sei onde contribuir, mas o futuro ancestral não é um projeto do Alok”, disse o artista, convidando a plateia a compartilhar e propagar esta visão.

“Não conheceremos o Brasil antes de conhecer a história indígena”, disse Célia Xakriabá


A aproximação do artista com a cultura indígena se deu em 2014, quando foi para uma aldeia num momento depressivo, de questionamento do sentido da música e da vida. Na ocasião, aprendeu a ressignificar valores ao constatar que os povos originários fazem música para curar enquanto ele fazia para entrar no Top 10 das paradas de sucesso. O impacto foi tão grande que, quando foi convidado para ser personagem do game Free Fire, anos depois, escolheu o superpoder de curar as pessoas. O personagem se tornou best seller e viabilizou fundos para o desenvolvimento do Instituto Alok.

Músico, líder espiritual e cacique, Mapu Huni Kui, do Acre, também participou do projeto e explica o papel da jiboia na cultura da sua etnia. “A jiboia é um ser sagrado, ancestral, que trouxe a medicina, que traz conhecimento. A medicina (ayahuasca) leva para a quinta dimensão, o campo espiritual. Dentro dessa força, traz cantos, grafismos e conexões com as plantas. Quando consagra a medicina, é a voz da jiboia que traz essa cura. Nos transformamos em ferramenta”, explicou o representante do povo Huni Kui.

Mapu Huni Kui apresenta canto de cura no palco (crédito: André Valentim)

Emergência climática

Assim como a parceria com os povos Yawanawá, Huni Kuin e Guarani para sua apresentação no Global Citizen Live Amazon, em 2021, a produção pretende chamar a atenção para o aquecimento global e a demarcação das terras indígenas. Existe uma emergência climática, não é só a Amazônia que vai salvar o mundo, temos o Cerrado, o segundo maior bioma, berço das águas, o Pantanal, que agora todos estão vendo a novela, o Pampa. Os indígenas são 1% da população brasileira e 5% do mundo, mas defendem 83% do bioma. É preciso entender que sem demarcação dos territórios indígenas não vamos parar o aquecimento global. Até hoje, só vi demarcação após caciques morrerem. É como se para cada casa comprada, alguém da família morresse. Essa é uma luta humanitária. Não teremos a cura do corpo se não tivermos a cura da terra”, defendeu Célia.

O desmatamento em terras indígenas foi de apenas 1% em 30 anos, enquanto que, em áreas privadas, a destruição chegou a 20,6% no mesmo período, segundo levantamento do MapBiomas.

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